A avaliação ambiental integrada da hidrelétrica foi concluída na
sexta-feira. É o primeiro passo para vender o complexo na Amazônia.
Com uma audiência pública marcada para o próximo dia 29, o governo
inicia oficialmente a corrida para licitar, ainda este ano, as primeiras
hidrelétricas da Bacia do Rio Tapajós, no Pará, considerada a nova fronteira
hidrelétrica brasileira. A audiência discutirá a Avaliação Ambiental Integrada
(AAI) da bacia, divulgada na última sexta-feira, que aponta impactos
cumulativos dos sete aproveitamentos hidrelétricos identificados na região, que
somam uma potência de 14,2 mil megawatts (MW). O objetivo é tentar evitar a
repetição dos conflitos que retardaram as obras de Belo Monte, no Rio Xingu,
maior usina em construção no país.
A primeira licitação da bacia do Rio Tapajós está prevista para
ocorrer ainda este ano. Será a usina de São Luiz do Tapajós, com potência
instalada de 6.133 mil MW. O planejamento do setor elétrico prevê ainda outra
usina na região com início de operações até 2020, Jatobá, com potência
instalada de 2.338 MW. Juntas, as duas têm capacidade para gerar o mesmo volume
de Belo Monte — que, embora tenha potência de 11.233 MW, garante a entrega de
4.571 MW médios durante o ano, 80 MW médios a menos do que a energia firme das
primeiras hidrelétricas da bacia hidrográfica do Tapajós.
O porte dos novos projetos e os impactos sobre a floresta
amazônica e comunidades indígenas leva a crer que a batalha pela sua aprovação
será semelhante à de Belo Monte, que envolveu até celebridades internacionais,
como o cineasta James Cameron, diretor do filme Avatar — que esteve em
Altamira, no Pará, para protestar contra a obra. “Obviamente, o governo terá
que travar uma batalha jurídica e contra ONGs internacionais”, diz Nivalde de Castro,
do Grupo de Estudos de Energia Elétrica do Instituto de Economia da UFRJ
(Gesel).
A própria Avaliação Ambiental Integrada é um passo no sentido de
tentar vencer resistências ao projeto. O trabalho não é previsto em lei, mas
sua ausência tem sido usada como argumento para ações do Ministério Público
para embargar projetos hidrelétricos no país. O documento divulgado na última
sexta-feira aponta, como principais impactos, alterações ecológicas, bióticas e
pesqueiras, fragilidade na conservação florestal pelo incremente da atividade
econômica, remoção de residências em áreas que serão alagadas e indução a
conflitos étnicos em territórios indígenas Munduruku — este último, um dos
pontos mais sensíveis na discussão sobre as obras na Amazônia.
Segunda-feira, representantes do Grupo de Estudos Tapajós —
formado por Eletrobras, Eletronorte, GDF SUEZ, Cemig, Copel, Neoenergia, EDF,
Endesa Brasil e Camargo Corrêa —, da Secretaria Geral da Presidência da
República e da Fundação Nacional do Índio (Funai) estiveram na aldeia Praia do
Mangue, em Jacareacanga, para negociar cronogramas. “Eles queriam saber como
queremos que sejam feitas as consultas prévias aos povos indígenas, que são
exigidas pela convenção 169 (da Organização Internacional do Trabalho)”, conta
Waldelírio Manhuary, uma das lideranças da etnia munduruku, que tem uma
população de cerca de 12 mil pessoas na região do Tapajós.
No ano passado, os mundukuru da região do Tapajós foram a Altamira
protestar contra o aproveitamento hidrelétrico dos rios da Amazônia. O grupo
passou oito dias ocupando o canteiro de obras de Belo Monte. Agora, Manhuary
diz que vai consultar o Ministério Público para definir uma estratégia de ação
nas discussões sobre as hidrelétricas da Bacia do Tapajós. “Com certeza a
construção das usinas vai afetar aldeias”, diz.
“A questão indígena é o principal desafio para a construção das
usinas”, comenta Adriana Coli Pedreira, advogada especialista em energia do
escritório Siqueira Castro e membro do Fórum de Meio Ambiente do Setor Elétrico.
“E percebemos que o governo quer fazer diferente de Belo Monte, com o
estabelecimento de um diálogo prévio com as partes afetadas, para que se sintam
parte do processo”, completa. O consórcio responsável pelos estudos trabalha
agora para finalizar o Estudo de Impacto Ambiental, que vai nortear o processo
de licenciamento. Pelo modelo do setor elétrico, uma usina só pode ir a leilão
se tiver a licença prévia.
A Bacia do Tapajós é considerada fundamental, por especialistas,
para garantir o crescimento do parque gerador brasileiro. A maior parte dos
projetos, porém, está em áreas virgens, ainda sem presença do homem. Para
vencer resistências, a Eletrobras chegou a desenvolver um projeto de
usina-plataforma, sem ligação rodoviária com cidades para evitar o desmatamento
das margens das estradas. Segundo a proposta, os trabalhadores seguiriam o
esquema de rodízio utilizado nas plataformas de petróleo em alto mar, com
turnos de duas semanas contínuas de trabalho. Mesmo assim, organizações
ambientais se preocupam com o potencial impacto durante as obras.
“O setor elétrico vive um dilema: ou aproveitamos o potencial da
Amazônia ou geramos termelétricas mais poluentes”, afirma Castro, reforçando
avaliação repetida pela área energética do governo. “Vemos com bastante preocupação
as ações de grupos contrários a hidrelétricas, que têm levado o Brasil a bater
recordes de emissões para gerar energia”, conclui. A última fronteira já
licitada foi a Bacia do Teles Pires, entre o Mato Grosso e o Pará, que é um dos
afluentes do Tapajós.
A nova fronteira da Bacia do Tapajós inclui outro afluente, o Rio
Jamanxim, e tem impactos mais presentes nos municípios de Itaituba, Trairão e
Jacareacanga, segundo a Avaliação Ambiental Integrada. Na região, há sete
terras indígenas delimitadas e quatro em estudo, além de 24 unidades de
conservação. O estudo identificou ainda uma série de questões fundiárias,
relativas a atividades econômicas em terras não regularizadas, e extração
mineral. Apenas para as duas primeiras usinas, está prevista uma área alagada
de 552 quilômetros quadrados, o equivalente à área alagada de Belo Monte.
Fonte: IG
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