segunda-feira, 13 de novembro de 2017

MPF recomenda cancelamento de audiências públicas sobre a Ferrogrão



O Ministério Público Federal (MPF) encaminhou à Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT) notificação em que recomenda o cancelamento de audiências públicas sobre a concessão da Ferrovia do Grão (Ferrogrão) previstas para as próximas semanas.

Segundo o MPF, é ilegal a realização de audiências públicas sem consulta e consentimento prévios, livres e informados de pelo menos 19 comunidades indígenas já identificadas ao longo do trajeto da ferrovia, além de ribeirinhos, agroextrativistas e outras comunidades tradicionais sujeitas a impactos.

Os procuradores da República Paulo de Tarso Moreira de Oliveira e Camões Boaventura, que atuam no Pará, e Malê de Aragão Frazão, que atua em Mato Grosso, também criticam a falta de previsão de audiências nos municípios que a ferrovia deve atravessar.

A ferrovia está planejada para o trecho entre Sinop, no Mato Grosso, e o porto de Miritituba, em Itaituba, no Pará. As audiências públicas estão programadas pela ANTT para os dias 22 e 27 deste mês em Cuiabá (MT) e Belém (PA), respectivamente, e para 5 de dezembro em Brasília (DF).

O MPF alerta, ainda, que a homologação dos estudos para a concessão da ferrovia sem a consulta e consentimentos prévios, livre e informados aos indígenas e às populações dos municípios diretamente impactados pode levar à anulação desses estudos, que custaram R$ 33,7 milhões aos cofres públicos, e tornar ilegal todo o processo da concessão da ferrovia, caso realizado.

Assim que receber a recomendação o diretor-geral da ANTT, Jorge Luiz Macedo Bastos, terá dez dias úteis para apresentar resposta. Se a resposta não for apresentada ou for considerada insuficiente, o MPF pode levar o caso à Justiça, inclusive por meio de ação por improbidade administrativa e de responsabilização por eventuais danos materiais ou morais à sociedade.

Medida antidemocrática - "O alijamento do processo decisório das populações indígenas e tradicionais que suportarão diretamente os impactos da ferrovia é medida antidemocrática que viola compromissos internacionais assumidos pelo Brasil", denunciam os membros do MPF no documento.

Entre as normas citadas na recomendação estão a Constituição, a Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT), a Declaração Americana sobre Direitos dos Povos Indígenas e a Convenção Americana de Direitos Humanos.

A Convenção nº 169 afirma que os governos deverão "consultar os povos interessados, mediante procedimentos apropriados e, particularmente, através de suas instituições representativas, cada vez que sejam previstas medidas legislativas ou administrativas suscetíveis de afetá-los diretamente", e que "as consultas realizadas na aplicação desta Convenção deverão ser efetuadas com boa fé e de maneira apropriada às circunstâncias, com o objetivo de se chegar a um acordo e conseguir o consentimento acerca das medidas propostas".

A recomendação destaca que o direito à consulta e consentimento prévios e à participação efetiva nas políticas de desenvolvimento estabelecidos na Convenção nº 169 não se restringem à primeira decisão administrativa de realização de determinada política pública e de desenvolvimento.

Esses direitos, segundo o MPF, "se desdobram no dever de colher a válida manifestação de vontade dos povos tradicionais afetados em cada ato administrativo que autoriza o prosseguimento da política pública, aí se incluindo a aquiescência para realização do estudo de viabilidade técnica dos empreendimentos".

De acordo com os procuradores da República, o relatório de viabilidade técnica da ferrovia homologado pelo Ministério dos Transportes sugere interpretação equivocada de portaria sobre a atuação de órgãos federais em processos de licenciamento ambiental (portaria interministerial nº 60/2015), induzindo conclusão errada de que o trajeto da ferrovia não afetaria áreas indígenas estar a mais de dez quilômetros de distância dessas áreas.

Para o MPF, essa conclusão viola o dever de informação às empresas licitantes, tendo em vista que pode haver resistência das comunidades interessadas e pedido judicial de anulação do processo de concessão, além do ajuizamento de outras ações.

Fonte: MPF

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