segunda-feira, 2 de março de 2009

Transamazônica tema: Agricultor ontem, “fora da lei” hoje

O ponto de partida para se fazer uma rápida análise das profundas mudanças estruturais que ocorreram na Amazônia nas últimas décadas, requer uma volta ao passado. Todos sabem como o projeto de integração nacional acarretou perversidades em termos ambientais e sociais. Mas, com sangue, suor e lágrimas deve-se reconhecer que existem pontos positivos neste processo de desenvolvimento. A Transamazônica foi planejada para atravessar o Brasil de leste a oeste: começaria com dois ramais, um a partir de João Pessoa (PB), outro do Recife (PE), que iriam se unir em Picos (PI), terminando em Boqueirão da Esperança (AC), na fronteira com o Peru, visando garantir uma saída para o Pacífico aos produtos brasileiros. Eram mais de quatro mil quilômetros de estrada na selva, seis mil incluindo os trechos nordestinos. Dois milhões de homens e mulheres, atraídos pelo desenvolvimento da região, vieram para perseguir o seu sonho. Cidades na rota, como Altamira ou Itaituba, cresceram, em três décadas, 1000% ou mais.
A Amazônia ficou famosa nos anos 60 quando um futurólogo americano, Herman Kahn, do Instituto Hudson sugeriu que se construíssem sete barragens para criar lagos gigantesco na Bacia Amazônica. Queria estimular o intercâmbio econômico entre os países da América do Sul e atrair investimentos estrangeiros em pesca, mineração e petróleo na região. Aos ouvidos do governo militar brasileiro soou como uma proposta de internacionalização da Amazônia, e as reações contrárias foram muito fortes. Alguns dos mega projetos inventados pelos militares para a região tiveram essa causa. “Integrar para não entregar” era um dos slogans oficiais da época. Os governos militares distribuíram terras e subsídios a quem se dispusesse a se embrenhar na floresta. A ação atraiu para o lugar pequenos agricultores e pecuaristas do Sul e do Sudeste. Desde então, a agropecuária floresceu onde antes só havia a atividade extrativista.
O governo militar brasileiro, tendo à frente o Presidente Médici institui por meio do Decreto Lei Nº1106, de 16 de julho de 1970, o Plano de Integração Nacional (PIN). Utilizando mão de obra nordestina oriunda das grandes secas de 1969 e 1970 e os grandes vazios demográficos amazônicos cunharam os lemas “integrar para não entregar” e “uma terra sem homens para homens sem terra”. O PIN destinou cem quilômetros de cada lado das estradas para a colonização por cerca de 500 mil pessoas, ou seja, uma meta de assentar cem mil famílias. A rodovia Transamazônica foi a principal via escolhida para a colonização.

Nas últimas duas décadas, a expansão do agronegócio fez com que as lavouras e pastos avançassem cada vez mais pela floresta, contribuindo para o desmatamento. Sabe-se que a mata amazônica já perdeu 17% de sua cobertura original. As imagens de satélite revelam que quase 40% dessa devastação foi realizada nos últimos vinte anos. Surge aí a questão: quanto é aceitável desmatar para dar lugar ao agronegócio? Ninguém sabe, porque nenhum governo produziu um plano de longo prazo para a ocupação da Amazônia.

Mas uma coisa é certa: os agricultores e fazendeiros estabelecidos na região não são criminosos porque derrubaram parte da floresta para tocar seu negócio. Eles contribuem para o desenvolvimento da Amazônia, criam empregos e somam pontos ao PIB do país. As estatísticas mostram que as toras retiradas ilegalmente da Amazônia chegam a 80% de toda a produção madeireira da região. Antes de serem vendidas em outros estados do Brasil e no exterior, essas toras são “legalizadas” por meio de documentos forjados. Já os fazendeiros e madeireiros que cortam madeira dentro da lei submetem-se a um plano de manejo sustentável aprovado pelo IBAMA e pelas secretarias estaduais de Meio Ambiente. O plano determina a quantidade de madeira a ser retirada e replantada.

As restrições ao desmatamento em terras privadas, estabelecidas por medida provisória em 1996, prevêem que o proprietário só pode desmatar 20% de seu terreno para plantar ou criar gado. A floresta nativa deve ser preservada nos restantes 80%. Chama-se a isso reserva legal. Até 1996, permitia-se desmatar 50% da propriedade. O endurecimento das regras teve efeito inesperado: o clima nas fronteiras agrícolas é de desobediência civil, uma vez que milhares de produtores rurais alegam ter adquirido terras com a expectativa de poder desmatar pelo menos metade da área. Pior do que isso: aqueles que, amparados pela lei da época, desmataram 50% da área, agora são enquadrados como “Fora da Lei”.

Neste caso, cabe fazer uma analogia bizarra: caso uma onda de criminalidade assolasse o País (se é que já não ocorre!) e houvesse uma epidemia de assaltos a bancos em todo o território nacional, o governo para solucionar o problema, poderia baixar um decreto determinando o fechamento das instituições financeiras por entender que o negócio não é seguro e oferece um grande risco a sociedade. É desta forma que o agricultor se sente!

O que precisa ser combatido é o desmatamento selvagem, feito à sombra dos órgãos ambientais, muitas vezes por grileiros de terras públicas que não hesitam em usar a força das armas contra quem se opõe a seus interesses.

O paranaense Reginaldo Greczyszn, de 42 anos, é um dos agricultores sulistas que migraram para Mato Grosso, substituindo a floresta por lavouras e pastos. Atualmente, ele planta 2.400 hectares de soja e arroz em Querência, a 800 quilômetros de Cuiabá. Como sua fazenda está irregular, pois já desmatou além dos 20% permitidos pela legislação, o agricultor corre o risco de ter problemas para vender a safra que colherá neste ano e pode perder o acesso ao crédito rural. “O governo incentivou todo mundo a desmatar e agora está nos empurrando para a ilegalidade”, reclama. (VEJA - Especial Amazônia). Famílias inteiras foram levadas pela oportunidade de um dia serem proprietários de terras, já que os grandes centros não davam essa oportunidade. Deixaram cidades e estados de origem para atender ao apelo da Nação. Muitos pagaram um preço alto demais por esse sonho, dado as doenças e perigos naturais que a densa mata oferecia. Famílias inteiras adoeceram e acabaram morrendo por malária e outras doenças tropicais que não foram diagnosticadas. Portanto, não é justo que os que sobreviveram e ajudaram a desenvolver a região, sejam tratados como bandidos e paguem pelo falta de planejamento do Governo Federal.

Essa gente merece no mínimo respeito, indenização moral e financeira


Fonte:diário de marilia

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